sábado, 13 de novembro de 2010

E.E. São João-Filosofia-1001-1002

O MITO DA CAVERNA, conforme em A República de Platão (Os
Pensadores, 1997)
O gênero acadêmico clássico é ilustrado com o texto ‘O Mito da Caverna’, em
A República, de Platão.
“Sócrates: Agora imagina a maneira como segue o estado da nossa natureza
relativamente à instrução e á ignorância. Imagina homens numa morada subterrânea, em
forma de caverna com uma entrada aberta à luz; esses homens estão aí desde a infância, de
pernas e pescoço acorrentados, de modo que não podem mexer-se nem ver senão o que está
diante deles, pois as correntes os impedem de voltar a cabeça; a luz chega-lhes de uma
fogueira acesa numa colina que se ergue por detrás deles; entre o fogo e os prisioneiros
passa uma estrada ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está construído um
pequeno muro, semelhante às divisórias que os apresentadores de títeres armam diante de si
e por cima das quais exibem as suas maravilhas.
Glauco: Estou vendo.
Sócrates: Imagina agora, ao longo desse pequeno muro, homens que
transportam objetos de toda espécie, que o transpõe: estatuetas de homens e animais, de
pedra, de madeira e toda espécie de matéria; naturalmente, entre esses transportadores uns
falam e outros seguem em silêncio.
Glauco: Um quadro estranho e estranhos prisioneiros.
Sócrates: Assemelham-se a nós. E, para começar, achas que, numa tal
condição, eles tenham alguma vez visto, de si mesmos e dos seus companheiros, mais do
que as sombras projetadas pelo fogo na parede da caverna que lhes fica defronte?
Glauco: Como, se são obrigados a ficar de cabeça imóvel durante toda a vida?
Sócrates: E com as coisas que desfilam? Não se passa o mesmo?
Glauco: Sem dúvida.
Sócrates: Portanto, se pudessem se comunicar uns com os outros, não acham
que tomariam por objetos reais as sombras que veriam?
Glauco: É bem possível.
Sócrates: E se a parede do fundo da prisão provocasse eco, sempre que um
dos transportadores falasse, não julgariam ouvir a sombra que passasse diante deles?
Glauco: Sim, por Zeus!
Sócrates: Dessa forma, tais homens não atribuirão senão às sombras dos objetos fabricados.
Glauco: Assim terá de ser.
Sócrates: Considera agora o que lhes acontecerá, naturalmente, se forem
libertados das suas cadeias e curados da sua ignorância. Que se liberte um desses
prisioneiros, que seja ele obrigado a endireitar-se imediatamente, a voltar o pescoço, a
caminhar, a erguer os olhos para a luz: ao fazer todos esses movimentos sofrerá, e o
deslumbramento impedi-lo-á de distinguir os objetos de que antes via as sombras. Que
achas que responderá se alguém lhe vier dizer que não viu até então senão fantasmas, mas
que agora mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, vê com mais justeza?
Se, enfim, mostrando-lhe cada uma das coisas que passam, o obrigar, à força de perguntas,
a dizer o que é? Não achas que ficará embaraçado e que as sombras que via outrora lhes
parecerão mais verdadeiras do que os objetos que lhe mostram agora?
Glauco: Muito mais verdadeiras.
Sócrates: E se forçarem a fixar a luz, os seus olhos não ficarão magoados?
Não desviará ele a vista para voltar às coisas que pode fitar e não acreditará que estas são
realmente mais distintas dos que as que se lhe mostram?
Glauco: Com toda certeza.
Sócrates: E se o arrancarem a força da sua caverna, o obrigarem a subir a
encosta rude e escarpada e não o largarem antes de o terem arrastado até a luz do Sol, não
sofrerá vivamente e não se queixará de tais violências? E, quando tiver chegado à luz,
poderá, com os olhos ofuscados pelo seu brilho, distinguir uma só das coisas que ora
determinamos verdadeiras?
Glauco: Não o conseguirá, pelo menos de início.
Sócrates: Terá, creio eu, necessidade de se habituar a ver os objetos da região
superior. Começará por distinguir mais facilmente as sombras; em seguida, as imagens dos
homens e dos outros objetos que se refletem nas águas; por último, os próprios objetos.
Depois disso, poderá, enfrentando a claridade dos astros e da lua, contemplar mais
facilmente, durante a noite, os corpos celestes e o próprio céu do que, durante o dia o Sol e a sua luz.
Glauco: Sem dúvida.
Sócrates: Por fim, suponho eu, será o Sol, e não as sua imagens refletidas nas
águas ou em qualquer outra coisa, mas o próprio Sol, no seu verdadeiro lugar, que poderá
ver e contemplar tal como é.
Glauco: Necessariamente.
Sócrates: Depois disso, poderá concluir, a respeito do Sol, que é ele que faz as
estações e os anos, que governa tudo no mundo visível e que de certa maneira, é a causa de
tudo que ele via com seus companheiros, na caverna.
Glauco: É evidente que chegará a essa conclusão.
Sócrates: Ora, lembrando da sua primeira morada, da sabedoria que aí se
professa e daqueles que aí foram seus companheiros de cativeiro, não achas que se alegrará
com a mudança e lamentará os que lá ficaram?
Glauco: Sim, com certeza, Sócrates.
Sócrates: E se então distribuíssem honras e louvores, se tivessem recompensas
para aquele que aparecesse, como olhar mais vivo da passagem das sombras, que melhor se
recordasse, das que costumavam chegar em primeiro ou em último lugar, ou virem juntas, e
que por isso era o mais hábil em adivinhar a sua aparição, e que provocasse a sua inveja
daqueles que, entre os prisioneiros, são venerados e poderosos? Ou então, como o herói de
Homero, não proferirá mil vezes ser um simples criado de charrua, a serviço de um pobre
lavrador, e sofrer tudo no mundo, a voltar às antigas ilusões e viver como vivia?
Glauco: Sou da tua opinião. Preferirá sofrer tudo a ter de viver dessa maneira.
Sócrates: Imagina ainda que esse homem volta a caverna e vai sentar-se no seu
antigo lugar: não ficará com os olhos cegos pelas trevas ao se afastar bruscamente da luz do Sol?
Glauco: Por certo que sim.
Sócrates: E se tiver de entrar de novo em competição com os prisioneiros que
não se libertaram de suas correntes, para julgar essas sombras, estando ainda sua vista
confusa e antes que seus olhos se tenham recomposto, pois habituar-se à escuridão exigirá
um tempo bastante longo, não fará que os outros se riem a sua custa e digam que, tendo ido
lá acima, voltou com a vista estragada, pelo que não vale a pena tentar subir até lá? E se
alguém tentar libertar e conduzir para o alto, esse alguém não o mataria, se pudesse fazê-lo?
Glauco: Sem nenhuma dúvida.
Sócrates: Agora, meu caro Glauco, é preciso aplicar ponto por ponto, esta
imagem ao que dissemos atrás e comparar o mundo que nos cerca com a vida da prisão na
caverna, e a luz do fogo que a ilumina com a força do Sol. Quanto à subida à região
superior e a contemplação dos seus objetos, se a considerares como a ascensão da alma para
a mansão inteligível, não te enganarás quanto a minha idéia, visto que também tu desejas
conhecê-la. Só Deus sabe se ela é verdadeira. Quanto a mim, na minha opinião é esta: no
mundo inteligível, a idéia do bem é a última a ser apreendida, e com dificuldade, mas não
se pode apreendê-la sem concluir que ela é a causa de tudo o que de reto e belo existe em
todas as coisas; no mundo visível, ela engendrou a luz e o soberano da luz; no mundo
inteligível, é ela que é soberana e dispensa a verdade e a inteligência; e é preciso vê-la para
se comportar com sabedoria na vida particular e na vida pública”.

AS TREVAS DA CAVERNA, conforme em O Mundo de Sofia, (Jostein
Gaarder, 1996)
O gênero romance é ilustrado com o texto ‘As Trevas da Caverna’, em O
Mundo de Sofia, de Jostein Gaarder.
“Imagine um grupo de pessoas que habitam o interior de uma caverna
subterrânea. Elas estão de costas para a entrada da caverna e acorrentadas no pescoço e nos
pés, de sorte que tudo o que vêem é a parede da caverna. Atrás deles ergue-se um muro alto
e por trás desse muro passam figuras de formas humanas sustentando outras figuras que se
elevam para além da borda do muro. Como há uma fogueira queimando atrás dessas
figuras, elas projetam bruxuleantes na parede da caverna. Assim, a única coisa que as
pessoas da caverna podem ver é este “teatro de sombras”. E como essas pessoas estão ali
desde que nasceram, elas acham que as sombras que vêem são a única coisa que existe.
Imagine agora que um desses habitantes da caverna consiga se libertar daquela
prisão. Primeiramente ele se pergunta de onde vêm àquelas sombras projetadas na parede
da caverna. Depois se consegue se libertar dos grilhões que o prendem. O que você acha
que acontece quando ele se vira para as figuras que se elevam para além da borda do muro?
Primeiro, a luz é tão intensa que ele não consegue enxergar nada. Depois, a precisão dos
contornos das figuras, de que ele até então só vira as sombras, ofusca a sua visão. Se ele
conseguir escalar o muro e passar pelo fogo para poder sair da caverna, terá mais
dificuldade ainda para enxergar devido à abundância de luz. Mas depois de esfregar os
80
olhos, ele verá como tudo é bonito. Pela primeira vez verá cores e contornos precisos; verá
animais e flores de verdade, de que as figuras na parede não passavam de imitações baratas.
Suponhamos, então, que ele comece a se perguntar de onde vem os animais e as flores. Ele
vê o Sol brilhando no céu e entende que o Sol dá vida às flores e aos animais da natureza,
assim como também era graças ao fogo da caverna que ele podia ver as sombras refletidas
na parede.
Agora, o feliz habitante das cavernas pode andar livremente pela natureza,
desfrutando da liberdade que acabara de conquistar. Mas as outras pessoas que ainda
continuam lá dentro da caverna não lhe saem da cabeça. E por isso ele decide voltar. Assim
que chega lá, ele tenta explicar aos outros que as sombras na parede não passam de
trêmulas imitações da realidade. Mas ninguém acredita nele. As pessoas apontam para a
parede da caverna e dizem que aquilo que vêem é tudo o que existe. Por fim acaba
matando-o”.

ANEXO D – AS SOMBRAS DA VIDA, de Maurício de Sousa
diponível in
http://www.youtube.com/watch?v=faCphlZOoG0

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom¹